Esta manhã escolhi um tema aparentemente fácil: hipocrisia. Mas ao dar início à organização de minha idéias para começar este texto, concluí que esta prática está já tão normal em nosso meio e tão banalizada que devia começar pelo óbvio antes de qualquer exposição de pensamento. Começando, então pelo que deveria ser óbvio, mas se perdeu em meio aos interesses e práticas distorcidas de nosso “maravilhoso mundo moderno”, vamos ao significado: “substantivo feminino. Vício que consiste em aparentar uma virtude, um sentimento que não se tem. Fingimento, falsidade.”.
Aparentemente pode parecer ridículo apresentar o significado do tema do texto, mas isso me foi de grande valia, pois trouxe a tona algo que pode ter passado desapercebido a muitos, inclusive a mim: a hipocrisia é um vício!
Com este dado em mente comecei a buscar pela memória os hipócritas de todos os níveis que vi passar pela minha vida e esta nova informação me deu uma visão diferente destas “pessoas” e de seus atos. Hoje olho para cada situação que assisti com menos raiva, com mais pena, mas com a mesma indignação.
Quando se olha para um hipócrita como um viciado se entende que ele é alguém doente e que precisa de tratamento, o problema é que este vício não dá “um barato”, um porre que você possa identificar e que possa se proteger da pessoa até ela voltar ao normal, pois o hipócrita está sempre fantasiado de “careta” e você só sabe que ele é um viciado depois de experimentar os efeitos de sua overdose.
Diferente do alcoólatra, que vem cambaleando e com a voz “pastosa”, o hipócrita vem inteiro, aparentemente mais lúcido e limpo do que todos a seu redor, trazendo nas mãos o troféu da bondade, honestidade e perfeição, enquanto o peito ostenta a faixa de “amigo, filho ou parceiro do ano”.
Enquanto o dependente químico sofre a imensa culpa de sua fraqueza no dia seguinte em que sucumbiu ao vício, o hipócrita delicia-se na ilusão de ter conseguido enganar mais um, de ter mais uma vez atuado com perfeição no papel de cordeiro, enquanto, na realidade, é o lobo mau. Nem sofre o “bode” do dia seguinte e nem a crise de abstinência, pois não se permite a isso, segue firme em seu vício! Assim concluí, triste, que não haverá um HA (Hipócritas Anônimos), porque não há hipócritas em busca da cura, não há um hipócrita desejando ser sincero, pelo menos, “apenas por hoje” e a situação das vítimas destes viciados se agrava, pois não há um traficante a se deter ou um bar a se fechar, a “droga” do hipócrita é manufaturada por ele mesmo, dentro dele mesmo e entregue por ele a ele mesmo, sem intermediários e sem deixar rastros deste crime hediondo. E assim, o mundo segue condenado ao convívio com estes viciados que, diferente dos demais, causam mais mal aos que estão à sua volta do que a eles mesmos. Não que não sofram, eu acredito que sofram sim, mas não agora enquanto ferem e destroem os que acreditam que eles sejam saudáveis e “caretas”, mas depois, muito depois, quando chegar a época da colheita e seus cestos estiverem cheios de ervas daninhas e amargas, sem nenhum bom fruto para saborear, numa época que, talvez, já seja tarde para arar a terra mais uma vez, semear, regar e aguardar uma nova colheita.
Vive sorridente, o hipócrita, uma hora aqui e outra ali, derrama rápida lágrima de mágoa ou indignação quando descoberto, e seu coração sangra e sofre pela injustiça de lhe apontarem o vício, mas ainda assim segue sorrindo, porque nesta lágrima produzida pelo seu próprio ópio, envolve outros tantos desavisados, ilude e engana com sua astúcia e falsidade num êxtase com jeito de overdose até aquele que o descobriu passar por mentiroso ou até o que enganou com suas lágrimas entorpecidas se descobrir como outra vítima ou, finalmente, até o dia de sua INEVITÁVEL colheita.
Este é um problema grave para o qual a sociedade, a polícia ou a ciência não apresenta qualquer solução. Não se pode deter este vício com associações, com grupos de ajuda, com a repressão policial, com leis ou mesmo com medicamentos que causem ao viciado enjôo ou outro tipo de rejeição a seu vício. É um vício danoso e extremamente traiçoeiro que condena o hipócrita à solidão e exílio do amor, amor que tudo pode, tudo crê, tudo suporta... exceto o vício pelo mal.
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