segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

A Crueldade Da Idolatria


Hoje um grande ídolo se aposentou: Ronaldo Fenômeno disse adeus ao futebol.
Dezenas de repórteres se acotovelavam numa sala para ouvir oficialmente a notícia do próprio Ronaldo, uns visivelmente emocionados pelo fim da grande carreira, outros poucos, felizmente, obcecados por encontrar um motivo para criar uma nova polêmica ou crítica.
Com início à coletiva, foi comovente ver um grande ídolo internacional curvar-se diante da determinação da natureza assumindo humildemente que “não dava mais” e perceber, dentre as linhas de seu discurso totalmente entrecortado por sua dor e emoção, que o “amor” de seus fãs tinha deixado profundas marcas, por mais que ele, de coração gigante e sábio, procurasse sempre deixar claro que de tudo, não lhe ficara nenhuma mágoa e que tudo tinha sido lindo, que sua jornada tinha sido maravilhosa.
Foi triste ver como as “chacotas inocentes” quanto a seu peso tinham sido ouvidas e computadas por seu coração, embora fossem oriundas de hipotiroidismo, mas ainda pior foi ouvir a voz de frio cortante de um comentarista da TV, que certamente nunca amargou a dor de nenhuma doença, dizer que ele tinha sua parcela de culpa em não emagrecer. Julgando que Ronaldo não teve força de vontade suficiente para fazer um regime, ou este comentarista ignorou toda a luta de tratamentos, fisioteparias e cirurgias a que este guerreiro fenomenal se submeteu para vencer a série de contusões que a vida lhe impôs como desafio, ou preferiu pensar que este fenômeno de determinação escolheu engordar, afinal o sobrepeso é uma escolha pessoal, todo aquele que quer emagrecer, simplesmente emagrece.
Aquele comentarista que, do alto de sua experiência, preferiu não ser humano e não lembrar que Ronaldo, embora fenomenal, também o é, julgava o ídolo mundial de uma geração como se fosse uma máquina, um produto e não uma pessoa que lutou, treinou, aprendeu, cresceu, desenvolveu enormemente seu talento e se tornou o melhor para finalmente ser julgado culpado porque seu corpo lhe determinou que era hora de desenvolver novos talentos e oferecer ao mundo outra forma de admirá-lo, desta vez não pela força de vencer, mas pela coragem de encarar o que ele chamou de derrota, com uma dignidade admirável que o fez ainda mais fenomenal do que em seus gols fantásticos e sua incrível capacidade de superação.
Ronaldo, em fenomenal surpresa a todos, elogiou e agradeceu à torcida do Corinthians, dizendo que nunca tinha visto tamanha entrega a um time. Elogiou e agradeceu àquela que o humilhou, ridicularizou e acusou de forma tão cruel e violenta que indignou tremendamente a todos no Brasil e no mundo. Ele, na grandeza que só cabe em um fenômeno, conseguiu entender o ódio brotando impunemente da idolatria e, dentre os dois, escolheu enxergar a idolatria e nela justificar toda a culpa que lhe foi imposta. Um time perdeu, isso sempre acontece, alguém sempre perde em uma disputa. Um time perdeu lutando, mas apenas o fenomenal Ronaldo curvou-se publicamente e pediu perdão pelo fracasso como que puxando toda a culpa para si, numa demonstração de amor ao time muito maior do que de toda a enfurecida torcida. Ele sim amou a camisa a ponto de proteger o time, o clube, o futebol e penitenciar-se pelo fracasso que deveria ser nomeado apenas de derrota, pois fracasso é palavra que não lhe cabe.
Ronaldo não fracassou. Ronaldo é um exemplo de vitória e de sabedoria, pois é preciso ser forte e corajoso para saber a hora de parar e tomar novo caminho.
Imprensa, comentaristas, humoristas, torcidas de todas as bandeiras o fizeram mocinho e bandido, o melhor e o pior, deus e diabo por toda sua carreira. Ronaldo foi fenômeno e fofômeno de acordo com sua performance diária, julgado por aqueles que por certo nunca erraram, nunca fraquejaram, nunca esmoreceram e muito menos fracassaram.
Foi cobrado de perfeição e força sobrenaturais das quais nem mesmo os super-heróis desfrutam. A idolatria de muitos o escravizou na bolha da vitória absoluta e lhe tirou o direito incontestável de ter altos e baixos como todos. O “amor” dos fãs negou ao ídolo o direito de ser humano.
Ronaldo, um fenômeno de sinceridade e humildade, rasgou seu coração diante da imprensa, expôs suas dores, todas as fragilidades que cabem em sua fortaleza, suas lágrimas e seu adeus sem máscaras, sem sensacionalismo, mas apenas e tão somente com a honra e integridade dos grandes guerreiros.
Aposentou-se um grande jogador e apresentou-se ao mundo um ser humano grandioso, gigante em honra e humildade, alguém para, mais do que nunca, ser chamado sim de GRANDE FENÔMENO.
Agradeço pelo grande show, antes nos jogos, hoje na vida! Aplausos para você, Ronaldo!


Um comentário:

  1. Muito bacana a sua reflexão. Difícil mesmo, enxergar os ídolos como seres humanos e perdoar-lhes as falhas.Mas o melhor é que o ídolo compreende isso e perdoa. Deve ser porque ele está acima, num pedestal , e vê as coisas do alto...
    bjs!

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