Desde que o mundo é mundo um engano paira sobre a humanidade e alguns insistem em achar que esperteza e inteligência são a mesma coisa, tem a mesma importância e causam o mesmo efeito. Eis aí um perigoso engano!
A inteligência vem da delicada mistura de preparo, estudo, sensatez e sabedoria, enquanto a esperteza busca atalhos e, preguiçosa, prefere blefar, envolver e manipular o que, teoricamente, geraria menos esforço do desenvolver inteligência e proporcionaria os mesmos efeitos. Mas, cuidado, isso não é verdade! Os efeitos de uma e de outra são muito diversos. Enquanto uma pode garantir sucesso, felicidade e realização plena, a outra pode gerar grande ilusão disfarçada de vitória que, em curto espaço de tempo perde o perfume, começa a cheirar mal, a se manchar com bolor e pode contaminar uma vida inteira com seu “fungo” de frustração e derrota.
Por uma questão natural não se pode supor que a esperteza possa superar a inteligência, principalmente porque a esperteza comete o erro de subestimar a inteligência; certinha, ponderada, e cautelosa demais; e, por ser demasiado segura, solta-se passando a agir sem qualquer estratégia ou sensatez, afinal “ninguém pode pegá-la”, e acaba por tropeçar em seus próprios passos, caindo vencida aos pés da inteligência que, paciente e sábia, espera o momento adequado para mostrar quem de verdade tem “poder de fogo”.
A esperteza blefa e quando seu blefe é frustrado, desdenha, finge não ligar, cria novas vitórias, inventa “felicidades” julgando nocautear a felicidade, sem se dar conta de que é a si própria que atinge quando abre mão de acatar os fatos reais que se apresentam optando por viver uma mentira ao invés de buscar um novo caminho, um caminho mais seguro, baseado no aprendizado que pode vivenciar.
A esperteza se ilude, se maltrata, empaca e, tola, não sai do lugar, achando que é menos trabalhoso impedir a inteligência de andar do que dar alguns passos. São perigosos os seus atalhos, conduzem a abismos, mas ela é míope e não enxerga, só se dá conta quando já caiu. Insensata, cai gritando que venceu, cai rindo e desdenhando como se cair fosse realmente seu plano, seu desejo de felicidade.
A esperteza é teimosa, não aceita mudar, se aperfeiçoar e chegar a ser inteligência. É orgulhosa! Prefere mentir uma vitória a assumir que errou, que perdeu, que jogou fora. Então podemos concluir facilmente: a esperteza é burra!
De um outro mundo, um mundo mais real e saudável, a inteligência observa a degradação diária da esperteza. Enfrenta com sabedoria seus blefes e vira o jogo, ri silenciosamente de suas vitórias inventadas, observa a criação de suas ilusões e conclui que mesmo sua sabedoria e preparo não pode entender toda a tolice da esperteza, e triste, lamenta. Mais uma vida para ser feliz se perdeu no labirinto dos atalhos que levam os espertos para longe deles mesmos.
A conclusão que se pode tirar de tudo isso é que a esperteza é a alternativa de alguém que se perdeu de si mesmo e, sem saber acender sua luz interior, não encontra o caminho de volta, passando a olhar o outro e a “espertamente” tentar viver suas conquistas, felicidades, realizações e até bens como se pudesse virar um espécie de espelho, refletindo para si o que é do outro, ao mesmo tempo que desdenha e, nervosamente, ri daquilo que não consegue refletir.
Diferente do que tenta aparentar, a esperteza está longe de ser uma qualidade, ao contrário, beira à neurose e transforma alguém com enorme potencial para o sucesso em pessoa maltratada pela inveja e a incapacidade de produzir sua própria felicidade.
Se os candidatos a espertos se interessassem em olhar para a história da humanidade rapidamente identificariam que os que optaram por atalhos e subestimaram a inteligência dos demais, por mais poderosos que fossem, foram esmagados pela sensacional virada da inteligência sobre a força opressiva e desleal que muitas vezes a esperteza tenta empreender.
Hitler, Napoleão, Bin Laden, César, Nero, Ronald Biggs, e tantos outros exemplos, mais ou menos famosos, mas todos escravizados ou vencidos por sua esperteza, superior a de todos no mundo! Muitos escravos de suas próprias ilusões.
Ao contrário da esperteza, a inteligência não pesa, liberta, abre portas, aponta caminhos, aumenta possibilidades e não teme errar, pois sempre se permite aprender com o erro e recomeçar mais forte do que antes, mais sábia e consciente de qual é sua meta de realização e felicidade.
A inteligência não se prende ao passado, olha para frente e segue! Do passado leva apenas o que aprendeu. Não se embriaga com mágoas ou desejos de revanche, apenas aprende e segue em frente, com passos calmos, mas firmes.
A esperteza levou o homem às guerras enquanto a inteligência o levou ao espaço em viagens fantásticas à lua e outros planetas;
A esperteza conduz o homem por perigosos atalhos enquanto a inteligência o possibilita novos caminhos com infinitas possibilidades de conquista;
A esperteza induz o homem ao crime, enquanto a inteligência cria as leis e estimula a disciplina para um mundo mais justo e feliz;
A esperteza ilude o homem enquanto a inteligência o ensina;
A esperteza leva o homem ao egoísmo e este, à solidão, enquanto a inteligência conduz às decisões que possibilitam a convivência e a felicidade de viver verdadeiramente o amor.
A esperteza, por não ter fundações, é rasa e frágil só podendo oferecer o que tem seu tamanho e força, mas a inteligência, que cresce com fundações seguras baseadas em sabedoria, estudo e aprendizado, aumenta eternamente em si mesma, pois nunca se acha pronta e oferece o que não pode ser roubado ou destruído, pois é pessoal e intransferível: FELICIDADE.
Esta pode ser até refletida, simulada ou inventada, mas nunca sai de seu território, as mãos de quem pertence. Aliás, creio que este é o maior erro da esperteza, não reconhecer o princípio da territorialidade. Ela começa blefando e enganando os que estão à sua volta para, através de atalhos, conseguir suas realizações e, por fim, blefa e engana a si mesma, perde o referencial e passa a ser vítima de suas próprias ilusões e ainda assim, tola, segue debochando do mundo sem conseguir ouvir as gargalhadas da vida às suas costas, porque o bacana mesmo é ser feliz de verdade!