sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

O traidor e a traição

A traição sempre foi uma coisa que me incomodou, me intrigou e, me desculpe a grosseria, me repugnou profundamente!
Nunca consegui entender o que leva uma pessoa a trair os sentimentos ou a confiança de alguém, de quem ela mesma escolheu estar próxima... Ficava chocada em perceber, assistindo aquele antigo programa "Linha Direta", que os algozes sempre estavam próximos às suas vítimas, eram parentes, vizinhos, amigos, cônjuges, namorados... Nunca era um desconhecido, mas sempre um traidor!
Quando se fala em traição o que vem imediatamente à mente de muitos é o adultério ou situações afins, mas traição é muito mais do que isso, ela é criminosa porque normalmente se vale do que o ser humano tem de mais valioso a oferece: amor, amizade e confiança.
Sei que a traição num relacionamento conjugal ou mesmo num namoro é dolorosa e terrível, mas esta é mais fácil de se compreender e perdoar, porque (eventualmente) pode ser oriunda de uma insegurança, uma carência, uma fraqueza ou mesmo uma circunstância que envolvesse todos os sentimentos citados anteriormente, mas quando se trai a confiança, a amizade de alguém, não se faz isso "sem querer", porque este ato invariavelmente envolve uma mentira e NINGUÉM MENTE "SEM QUERER"!  A mentira sempre é pensada, planejada e premeditada. A mentira é suja, tanto quanto a traição.
Ultimamente, depois de presenciar algumas e viver com meu marido traições inomináveis de parentes e amigos, resolvi dedicar alguns momentos de minha vida a tentar entender o mecanismo que envolve esta atitude tão antagônica que normalmente promove uma punhalada na mãos que afaga.
Repassando em minha mente todas as que presenciei e principalmente as que vivi. conclui que não encontrava explicação porque a traição não se inicia e encerra nela mesma, mas é apenas uma válvula de escape, uma manobra desesperada de um sentimento ainda mais danoso, nocivo e imundo para quem o sente: a covardia! 
A covardia é um tipo de medo; não o medo saudável, aquele que nos alerta do perigo e nos faz buscar a devida proteção; mas o medo desonesto, aquele que quer nos esconder de nós mesmos, de nossas fraquezas e fracassos. Este medo "pequeno", um medo temperado por inveja, complexos e frustrações,  tem sido, invariavelmente, a origem das mais terríveis e sórdidas traições.
O medo de enfrentar o fim de um relacionamento, o fracasso profissional, a incapacidade empreendedora, as frustrações pessoais, as irresponsabilidades, as consequências de desonestidades, ou pior, o medo de enfrentar a felicidade e sucesso do "amigo", enfim: o medo de encarar e assumir os frutos do que se é! 
É claro que parece ser muito mais simples driblar a verdade e se tornar vítima de uma pessoa ou situação do que ter que enfrentar seus próprios demônios e admitir que errou, que fracassou e terá que reaprender a viver por outros caminhos e de outra forma. Realmente esta parece ser uma fórmula mais simples, mas isso é apenas tão somente uma maquiagem, destas que, não sendo à prova d'água, se desfazem com um simples banho de chuveiro, deixando o rosto imundo, todo borrado, muito mais disforme e defeituoso do que o original, antes da pintura!
A traição deforma a alma e a vida do traidor, mas ele é (que ironia) traído por suas ilusões, e não percebe. É comum ver o traidor amargar o arrependimento sem poder voltar atrás... Até aonde ele chegou não dá para retornar sem se expor diante dele mesmo! 
O traidor é egoísta e parcial, é a mistura dos piores sentimentos, é alguém que mente (corajosamente, que ironia!!!), para não ter que assumir suas culpas; é aquele que aposta todas as suas fichas em lançar no outro; normalmente aquele que o apoiou e ajudou quando ninguém mais o faria; todos os motivos de seu evidente fracasso, de forma a se transformar numa vítima daquele que o acolheu de coração aberto e confiou sem desconfiar.
O traidor é sempre um "injustiçado" que só está daquele jeito; endividado, desempregado, sozinho e passando por todo tipo de privações; porque alguém o explorou, roubou e enganou, por isso ele precisa desesperadamente de uma chance, uma ajuda para recomeçar e finalmente... trair mais uma vez. Sim, trair novamente, pois como a mentira, a traição se torna um vício e o traidor facilmente entra em crise de abstinência... Ser leal para ele é algo absolutamente impossível!
O traidor passa a vida inteira tentando se livrar das sujeiras que ele mesmo produz, mas é imundo na alma e só conhece um mecanismo de limpeza: sujar-se mais uma vez com mais mentiras para justificar-se, caindo, invariavelmente em nova traição. Ele vive a eterna ilusão de que jamais será descoberto porque ocupa todo o seu tempo em tentar denegrir a imagem daquele a quem traiu, tentando fazer com que o mundo inteiro possa entender que tudo o que fez foi para defender-se das terríveis maldades e injustiças que sofreu daquele que todos "achavam" que estava lhe ajudando. . .
O traidor se ilude achando que ele nunca será descoberto pelo mundo à sua volta, mas engana-se, pois não há nenhuma mentira tão bem contada que não venha a ser descoberta.
O traidor é um tipo de ser ímpar, de tão pequeno e incoerente! É um ser sem vida que passa os anos como um satélite inútil ao redor daqueles que efetivamente buscam vida em seus sentimentos e atitudes, caindo e levantando diante  dos acontecimentos e de cada dia que o mundo lhe impõe. De tão pequeno, o traidor é o único ser do universo capaz de morder a mão que o alimenta... nem mesmo os animais peçonhentos fazem isso!
O traidor é, veja que ironia, traído por sua ambição desonesta e acredita que poderá extrair mais vantagens se enganar aquele que lhe ama e ampara e, desta forma, joga fora não só o que ganhava, mas todas as possibilidades de receber amor, apoio e ajuda incondicional por uma vida inteira e tudo isso por, quem sabe, alguns 20 ou 30 por cento a mais do que desfrutava inicialmente... Em pouco tempo ele não tem nada e nem a quem recorrer, nada lhe restará do que contemplar sua existência equivocada e sua coleção de fracassos que pode esconder de muitos, mas nunca dele mesmo, pois a árvore se conhece pelos frutos e aquele a quem traiu pode ter sofrido traumas e prejuízos, mas sua própria natureza amorosa se encarregará de renová-lo e restituí-lo com mais do que o dobro do que perdeu, mas o traidor é uma árvore seca e morta, sem frutos ou raiz, a mercê do tempo e lenhadores implacáveis.
O traidor mente, rouba, engana e sorri pensando que driblou a todos e venceu... Pena... Não consegue enxergar que tudo o que viveu e construiu apenas fez  dele o que ele é em sua essência: um covarde traidor vivendo o terrível castigo de, pela eternidade, sentir em sua boca o sabor do alimento que carinhosamente lhe ofertou aquele quem ele traiu.

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