quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Desacelere

Chegamos ao final de mais um ano. Muita festa, alegria, promessas e metas a serem cumpridas, muitas metas...
A globalização deixou o mundo ao alcance de todos, encurtou distâncias. A velocidade das informações encurtou o tempo e passamos a correr mais, correr sempre, correr demais!
Corremos tanto que as vezes tenho a sensação que nem mesmo sabemos por que ou para onde.
O mundo moderno trouxe tantas possibilidades, caminhos e horizontes; tantas riquezas, ilusões e alternativas de sucesso que parece embriagar e lançar a todos numa busca frenética que nunca cessa, uma busca com jeito de nunca se satisfazer.
Antes nossos sonhos tinham início, meio e fim. Vivíamos a fase do desejar, a do produzir e finalmente o prazer incrível de curtir a realização, de desfrutar a conquista. Agora os sonhos parecem envelhecer no meio do produzir e o desejo muda por algo mais atraente e brilhante, muda todo o foco e recomeça a nova produção sem o gozo indescritível da realização e conquista.
Não vai aqui nenhuma crítica a sonhar sempre e mais. Sonhar é maravilhoso e oferece à vida um colorido ímpar! Movimenta, transforma, alegra, torna tudo mais dinâmico e vivo. Sofro apenas a dor de ver sonhos abandonados morrerem sem conclusão, jogados fora como que sem valor, à margem de um mundo tão veloz que apagou o brilho do sonho dourado, tornou-o fosco colocando à frente da vida um diamante inatingível como a antiga cenoura pendurada à frente do cavalo para fazê-lo correr para pegá-la, sem jamais alcançá-la.
Sonhos não envelhecem. São pessoais e intransferíveis e é justamente isso que os torna tão valiosos: ter valor diferenciado a cada um.
A inversão de valores que o mundo moderno nos impõe jogou fora o lúdico e trouxe como única alternativa de felicidade e realização o sucesso sob a forma de fama, poder e dinheiro. Todo o resto passou a ser sinônimo de fraqueza, decadência e fracasso.
Ei, pessoal, o que aconteceu com o prazer de tirar férias de 30 dias? Nada disso de vender 10 dias! Planejar viagens, rever parentes e amigos e tirar um monte de fotos para recordar, onde foi parar tudo isso?
Onde foi parar o plano para aposentadoria? Casa no campo, viagem aquele local sonhado no exterior, descanso, paz e ritmo calmo para desfrutar a melhor idade?
Que armadilha é essa que este nosso “fantástico mundo moderno” nos trás onde aposentadoria é démodé e as empresas abrem as portas aos profissionais que querem continuar trabalhando mesmo depois de aposentados? Que ritmo louco é esse que se empreendeu à vida, onde a hora de descansar acabou e sempre é hora de recomeçar, de trabalhar mais, mesmo que não se entenda muito bem por que.
O mundo diz que é preciso ganhar mais, pois já não é mais possível ser feliz com “uma casa no campo com discos, livros e nada mais”!
A felicidade das coisas simples foi abolida! O simples acabou, ficou desinteressante e sem valor. Descansar virou sinônimo de desistir e desfrutar agora é compreendido como recuar.
A modernidade ensina que agora a sabedoria repousa em correr, buscar e trabalhar muito, frenética e incessantemente em busca de algo inatingível e desconhecido, mas sem desistir, sem descansar e sem desfrutar. Mas espere, se desfrutar for inevitável, ainda pode fazê-lo entre um expediente e outro, num happy hour, ou num final de semana prolongado, desde que volte correndo no primeiro dia útil seguinte, mesmo com sono ou ressaca, mas reinicie imediatamente sua corrida a algum lugar para buscar alguma coisa, seja o que for.
Uma pena. Em meio a correria, perde-se a calma do sorriso tranquilo, a paz de não precisar olhar o relógio a cada minuto e a alegria de poder se manter a pelo menos um metro do celular e tudo isso por nada, ou por alguma coisa que não entendemos bem o sentido, porque estamos correndo demais para esta compreensão.
A história modificou-se sozinha e o mundo que nos foi oferecido para nosso regalo, tirano, nos fez servo dele e cobra de forma cruel e implacável que nos adaptemos às suas normas e padrões sob pena de ficarmos à margem da felicidade que é capaz de oferecer.
Felicidade? Este novo padrão tirano há de ter outro nome que não felicidade!
A felicidade é algo diferente que se identifica muito mais com o formato original, onde o mundo foi criado para nos servir de cenário lindo e sustento seguro de alimento e paz.
Precisamos retomar a calma, a tranquilidade do “um passo de cada vez” ou do “há hora de plantar e hora para colher”. É verdade, pode acreditar: para tudo há um momento certo!
Há momento de repousar a cabeça num colo amoroso; de ouvir boa música olhando pela janela; de sorrir vendo fotografias; de fazer uma receita antiga; de tomar café da manhã com calma; de conversar fiado com um amigo; de fazer planos que envolvam sorrisos, amigos, parentes e lugares bonitos...
Há tempo de rever sonhos, de reeditar desejos para simplesmente desfrutar da alegria de sua conquista, sem precisar mostrar ao mundo, sem ter que provar nada para ninguém, mas simplesmente, sorrir com o coração e reconhecer a felicidade numa respiração lenta e profunda, num suspiro delicioso que traduz a sensação de “o mundo parou para mim”!
Pressa para que? Pressa por que?
A vida não tem replay, então precisamos saborear o agora entendendo que não é a toa que o agora é chamado de “presente”. Um presente maravilhoso que não pode ser desperdiçado pela correria de um mundo que quer nos vender falsos padrões de felicidade e realização, um mundo repleto de “ouro de tolo” com seu brilho encantador de pura ilusão.
Perdi as contas de quantas vezes, neste últimos dias, ouvi alguém dizer, ou eu mesma disse “este ano voou”!!! E voou mesmo, de repente, Natal! Não vamos permitir que ele voe também, ele é significativo demais para o perdermos em meio a correria de compras, presentes e preparativos de ceia, para depois cairmos na cama exaustos, sem respirar a essência que envolve esta data.
É Natal, desacelere!
Respire fundo, acalme seu coração e retome sua função no mundo: você é o gerente!
Não somos servos do mundo, mas de nossa vida. Vida que nos foi ofertada e cuidada graciosamente por um Deus de amor, paz, sabedoria e calma. 


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